Saudade é um sentimento que quando não cabe no coração, escorre pelos olhos.
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Hoje é dia do pai… Dia que me deixa duplamente infeliz. Por um lado o desgosto de ter tido um pai que só o foi de nome, de resto, nunca foi verdadeiramente meu pai, muito pelo contrário… eu nunca faria o que ele me fez a ninguém, muito menos a um filho. Por outro lado, o desgosto de não ter filhos, algo que evito desejar mas que me massacra a mente todos os dias. O dia já se adivinhava infeliz e desgostoso, não precisava do bónus que tive, ter de rever quem mais me feriu nesta vida, alguém que desejei para fazer feliz, para ser a mãe dos meus filhos e que, tal como o meu pai, me deixou nesta estrada da vida ferido e a sangrar da alma, quase morto e a desejar um abraço gélido e eterno da morte. Está difícil de aguentar este dia, a cada lágrima que cai, um passo para essa intemporal morte que teima em não me abraçar, que teima em não me receber de braços abertos. Tento sobreviver mas cada vez aguento menos estes dias de angústia em que tenho de “fingir” que está tudo bem, custou-me tanto trabalhar com isto na mente hoje… Mas a vida vai continuando castigada por estes castigos contínuos que me fazem sangrar da alma, que reabrem todas as feridas passadas que ainda não cicatrizaram. Resta-me deitar e encostar a cabeça, tentar descansar a mente de todos estes fantasmas e tentar adormecer com estas lágrimas todas a fugir dos olhos já sem brilho pela vida, por estes olhos mortos e inertes que reflectem uma alma tão… tão… sei lá…
Lágrimas Ocultas
Se me ponho a cismar em outras eras
Em que ri e cantei, em que era querida,
Parece-me que foi noutras esferas,
Parece-me que foi numa outra vida …
E a minha triste boca dolorida,
Que dantes tinha o rir das primaveras,
Esbate as linhas graves e severas
E cai num abandono de esquecida!
E fico, pensativa, olhando o vago …
Toma a brandura plácida dum lago
O meu rosto de monja de marfim …
E as lágrimas que choro, branca e calma,
Ninguém as vê brotar dentro da alma!
Ninguém as vê cair dentro de mim!
Florbela Espanca, in “Livro de Mágoas”
Hoje à noite fui dar um passeio, um longo passeio a pé. A esperança de que algo mudasse na minha vida ou em mim era muita, mas que idiota me senti, como se por magia, no fim do passeio, o mundo mudasse ou, em contrapartida eu ficasse diferente, melhor… As ruas estavam estranhamente desertas, vazias como a minha alma. Ao longe a lua ilumina os meus passos mas não me guia rumo à mudança, rumo à felicidade. Oiço o mar ao longe, aproximo-me mais dele na vã esperança de nele encontrar uma solução para toda este sofrimento. Chego lá e só oiço lamentações deste mar em que tanto confio os meus mais íntimos segredos e sentimentos. De repente desejo que a chuva caia, para disfarçar estas lágrimas que me começam a cair. Sabes, meu amigo mar, muita da água que formam as tuas onda são lágrimas minhas, lágrimas que chorei a teu lado, lágrimas carregadas de dor, de sofrimento, de solidão e de carência. Mas sinto que nem tu me vales, com tantas histórias de dor que já ouviste, és incapaz de me aliviar e de me confortar deste desgosto que me corrói e que arde cá dentro, que me mata mais um bocado a cada momento que passa. Olho para a lua e sinto que até ela me abandonou, mas perdoo-te minha amiga lua, todos acabam por me abandonar. Este ciclo de abandono começou muito cedo na minha vida, com o meu pai, por vezes penso que se até o meu pai me abandonou porque alguém há-de querer-me. Talvez o mal esteja em mim e não nos outros, talvez a causa do meu sofrimento seja eu mesmo e não os outros. Não sei, sinto que já não consigo raciocinar, os meus pensamentos estão cada vez mais vagos, diluídos nas lágrimas que teimam em escorrer-me pela face. Deito-me na areia, oiço o mar e vejo a lua e penso em ti. Tento entender mas já tenho dificuldade em me entender a mim próprio. Como preciso de ti, como preciso do teu amor, como preciso do teu carinho, como preciso de estar apenas ali, deitado no colo quente e reconfortante dum abraço dos teus braços. Por momentos imagino-te ali a meu lado, mas cedo percebo que não passa duma miragem do meu desejo. Então diluis-te com as minhas lágrimas e desapareces da minha realidade. Levanto-me com os olhos vermelhos e a cara molhada de lágrimas e parto então em rumo à mesma realidade de sempre, à minha tristeza, ao ódio pela minha vida, à vontade de não viver mais um dia neste inferno, desejando que o amanhã não chegue para mim, que chegue apenas à eternidade vazia, fria e escura da morte. Morte que espero que seja a minha paz…
“Sometimes I feel I’m gonna break down and cry (so lonely)
Nowhere to go, nothing to do with my time
I get lonely, so lonely, living on my own”
Freddie Mercury – Living On My Own
Brian May – Too Much Love Will Kill You
“A tristeza do olhar
A dor dentro de mim
A vontade de chorar
Ninguém sofre assim”
Império dos sentados – Longe de ti
But what use of flowers in the morning
When the garden they should grow in is not mine
And what use is sunshine if I’m crying
And my falling tears are mingled with the wine